Teodulfo de
Orleães (em latim:
Theodulfus Aurelianensis;
Aragão, c.750/760
- Angers, 18
de dezembro de 821)
foi um escritor, poeta e bispo de Orleães (entre cerca
de 798 e 818) durante os reinados de Carlos
Magno e Luís, o Piedoso. Foi um dos protagonistas do
chamado Renascimento carolíngio e uma figura
importante durante as muitas reformas realizadas na Igreja
durante o Império Carolíngio. Além disso, é quase certo
que ele seja o autor do "Libri Carolini",
"em grande medida a mais completa afirmação da atitude ocidental frente
à arte representacional que nos legou a Idade
Média".[1]
Finalmente,
Teodulfo é lembrado também por que seu oratório privado (ou capela), construído
em sua villa
em Germigny-des-Prés, sobreviveu e nele se pode
admirar um mosaico
datando, provavelmente, de 806.[2]
Vida
Teodulfo nasceu
na Hispânia,
provavelmente em Saragoça, entre 750 e 760, e era de ascendência visigótica.
Foi obrigado a fugir por causa da ocupação moura da região e
viajou para uma província do sudoeste da Gália chamada Aquitânia,
onde foi educado.[3]
Em seguida, Teodulfo se juntou ao mosteiro perto
de Maguelonne, no sul da Gália,
liderado pelo abade
Bento
de Aniane. Durante uma viagem a Roma em 786, Teodulfo ficou admirado com as escolas que viu e
enviou cartas para muitos abades e bispos por todo o Império dos francos encorajando-os a fundar
escolas públicas.[4]
Carlos Magno
reconheceu a importância de Teodulfo incluindo-o em sua corte e nomeando-o
simultaneamente bispo de Orleães (c. 798) e abade de
muitos mosteiros, principalmente a abadia beneditina
de Fleury-sur-Loire.[5]
Logo ele começou a fundar escolas nas regiões que agora estavam em sua
jurisdição e rapidamente tornou-se um dos teólogos favoritos de Carlos Magno
juntamente com Alcuíno da Nortúmbria, envolvendo-se profundamente nas
reformas que o imperador começou a realizar na Igreja.
Nesta função,
envolveu-se na edição de diversos traduzidos que Carlos Magno acreditava
estarem incorretos e passou a traduzi-los novamente diretamente do grego
antigo e do hebraico.[6]
Em 814, o imperador morreu e foi sucedido por seu filho, Luís, o Piedoso.[7]
O sobrinho dele,
o rei Bernardo da Itália declarou independência dos
francos e se preparou para uma guerra. Porém, foi convencido a se render e
acabou punido severamente por Luís, que mandou cegá-lo. O procedimento deu
errado e Bernardo morreu em decorrência das complicações.[8]
Luís acreditava que sua corte estava repleta de conspiradores e aliados de
Bernardo, incluindo Teodulfo, que foi acusado de traição. Ele foi forçado a
abandonar sua sé em 817 e foi exilado para um mosteiro em Angers no ano
seguinte, onde passou os dois anos seguintes de sua vida.[9]
Em 820, foi solto e tentou retornar para Orleães, mas não conseguiu chegar lá,
pois, acredita-se, morreu no caminho ou logo que chegou. A data era 18 de
janeiro de 821 e seu corpo foi levado de volta para Angers, onde está
enterrado.[10]
De acordo com
uma fonte, é possível que Teodulfo tenha se casado no início de sua carreira e
da relação tenha nascido uma filha chamada Gisla.[11]
· Villa em
Germigny-des-Prés
O oratório de Germigny-des-Prés, um exemplo da arquitetura carolíngia, foi construído por
Teodulfo em 806 como parte de sua villa
galo-romana
em Germaniacus, onde era também abade do mosteiro de Saint-Benoît-sur-Loire. O complexo foi, de
maneira geral, foi modelado no Palácio de Aachen, de Carlos Magno, a sede do
poder no Império Carolíngio na época.
Todo o complexo,
com exceção do oratório, foi destruído pelos normandos
(que estavam emergindo dos viquingues) antes de completar cem anos. A villa
tinha afrescos
sobre as sete artes liberais, as quatro estações e o mappa
mundi,[12]
além de um mosaico
no oratório que é praticamente o único mosaico carolíngio a sobreviver - ainda que muito
restaurado na década de 1860, quando o edifício recebeu o que hoje se considera
uma desastrosa reforma, repleta de restauros exagerados. O tema do mosaico, a Arca da Aliança com os típicos anjos, só se
encontra em Bíblias
judaicas antigas (geralmente como única ilustração) e provavelmente tem
relação com o "Libri Carolini", no qual a arca, com seus querubins de
ouro, é mencionada como uma prova importante da aprovação divina das imagens
religiosas (vide iconoclasma para a controvérsia que sacudia o mundo
cristão na época).
Obras
· Capitulárias
Como bispo de
Orleães (798-818), Teodulfo escreveu dois importantes capitulários[13]:
- Capitula ad presbyteros
parochiae -
um lembrete aos sacerdotes de sua diocese sobre a importância do
trabalho manual, do estudo, da oração e da castidade.
- Capitula altera Theodulpho
episcopo Aurelianensi adscripta
- com foco em seu código penitencial, Teodulfo lista as consequências do assassinato, adultério, fornicação, incesto, roubo, usura e outras infrações.
· Hinos
Teodulfo compôs
também muitos hinos e o mais famoso deles é "Gloria, laus et honor".
· Libri Carolini
É quase certo
que Teodulfo seja o autor dos "Libri Carolini"
(ca. 793), uma obra que serviu de refutação a uma má tradução dos atos do
Segundo Concílio de Niceia (787) que
acabou sendo erroneamente interpretada como afirmando que a "adoração de
imagens" seria aceitável.[14]
Os atos de fato ordenavam o fim do período
iconoclástico, que levou à destruição de muitas imagens sagradas das igrejas,
especialmente em Constantinopla, mas não defendia a idolatria.
Esta tradução incorreta seguiu de Roma para a corte de Carlos Magno, que, juntamente com seus
teólogos, incluindo Teodulfo, ficou furioso. Teodulfo recebeu ordens de
escrever uma resposta em nome de Carlos Magno de forma a representá-lo como
único representante do mundo ocidental e defensor da Igreja contra a idolatria.[15]
De acordo com os
"Libri Carolini", imagens podem ser utilizadas em ornamentos
eclesiásticos para fins educativos e para relembrar eventos passados. Seria
tolice, porém, queimar incens ou acender velas para elas, apesar de ser
igualmente errado retirá-las das igrejas e destruí-las. A obra nega
veementemente a "adoração" das imagens - um reflexo da tradução
incorreta do que determinou o concílio em Niceia - afirmando que adoração se
reserva a Deus
apenas, enquanto que a veneração
se dedica aos santos
e uma reverência é corretamente aplicada à cruz, às Escrituras, aos vasos
sagrados e às relíquias. A palavra grega προσκύνησις que aparecem nos
atos do concílio significa nada mais do que esta reverência numa posição de prostração.[16]
Referências
1.
Dodwell, C.R.; The Pictorial
arts of the West, 800-1200, p. 32, 1993, Yale UP, ISBN 0-300-06493-4
2.
Dodwell,49
3.
Freeman & Meyvaert 2001, p.
125.
4.
Baunard 1860, p. 54.
5.
Freeman & Meyvaert 2001, p.
126.
6.
Baunard 1860, p. 77.
7. Baunard 1860, p. 296.
8. Baunard 1860, p. 300.
9. Baunard 1860, p. 301.
10. Baunard 1860, p. 322.
11. Smith - Wace, p. 985.
12. Beckwith, 13-17
13. de Clercy 1930, p. 8.
14. Freeman 1957, pp. 663-664.
15. Freeman 1957, p. 665.
16. "Caroline Books (Libri Carolini)" na edição de 1913 da Enciclopédia Católica (em inglês). Em domínio público.
Bibliografia
·
Smith, William
& Wace, Henry, A Dictionary of Christian Biography, vol. 4. ,
· Monsignor Louis
Baunard, Théodulfe, évêque d'Orléans et Abbé de
Fleury-sur-Loire. Orléans,
1860.
· C. de Clercy, Quelques
Status Diocésains de L'époque de Charlemagne. Anvers, 1930.
·
A. Freeman,
"Theodulf of
· Ann Freeman and Paul
Meyvaert (2001). «The Meaning of Theodulf's Apse Mosaic at Germigny-des-Prés». Gesta. 40 (2): 125-139. JSTOR 767242
· A. Freeman, Theodulf
of Orléans: Charlemagne's Spokesman Against the Second Council of
· N. Staubach,
"Zwischen Mythenallegorese und Idolatriekritik. Bischof Theodulf von
Orléans und die heidnischen Götter," in Christine Schmitz und Anja Bettenworth
(hg.), Menschen - Heros - Gott: Weltentwürfe und Lebensmodelle im Mythos der
Vormoderne (Stuttgart, Franz Steiner Verlag, 2009), 149-166.
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