Rosvita
de Gandersheim
(em alemão: Hrotsvit
ou Roswitha; c. 935 - c. 973/1002) foi um grande
exemplo da literatura de fundamentação cristã em terras
germânicas, sendo conhecida como a primeira poetisa de origem germânica, tendo
escrito toda a sua obra em latim. O pouco que se
sabe sobre sua vida provém do que a autora deixou registrado em sua obra.
Nascida por volta de 935 e falecida por volta do ano 1000, era uma das poucas
mulheres que, nesta época, se distinguiram pela cultura e refinamento. Por
volta dos 23 anos, entrou para um convento beneditino em Gandersheim, que era um
importante centro cultural, onde eram copiados livros antigos e tinha a
proteção real, só aceitando noviças de ascendência
nobre. Lá, foi aluna da abadessa Gerbig, que era sobrinha de Otto, o Grande, o patrono do
convento. Por isso, acredita-se que Rosvita seja descendente da nobreza
germânica, embora procurasse se retratar como uma mulher de grande humildade,
uma “mulher obscura”, uma “freira pobre”, que “pela graça do Criador...
adquiriu pouco conhecimento das Artes”. Rosvita se auto proclamava “a voz forte
da abadia de Gandersheim”.
Biografia
A primeira poetisa alemã
Hrotsvit (Roswitha ou Rosvita, cujo nome vem do Althochdeutsch: Ruhmstarke - Hruod=Ruhm=”fama”,
“glória” Swinths=stark=”forte”) cresceu durante o auge do séc. otoniano. Ela
nasceu aproximadamente em 935 e descende de uma família nobre - provavelmente
da nobreza saxã. Muito cedo - ainda no tempo do Imperador Henrique I
- ingressou no mosteiro beneditino de Gandersheim, onde passou toda sua vida e
viveu sob o título de canonisa (ou cônega). Filhas de famílias nobres
freqüentemente escolhiam este tipo alternativo de vida, para escapar de um
casamento indesejável ou imposto. Depois que ela entregou sua vocação ao
convento, pôde, sob a soberania da abadessa, receber o título de canonisa, o que
significava, entre outras coisas, poder ter seus próprios patrimônios e suas
próprias criadas. Para as jovens mulheres - entre as quais provavelmente
Rosvita - havia um grande ideal, o de se tornar canonisa, que era a
oportunidade de participar da luta a favor do cristianismo
ou de manter uma boa condição social sem precisar se casar. Ao lado de Quedlimburgo,
Gandersheim era, no tempo de Rosvita, o mais importante convento real da Saxônia.
Através do Imperador Otto I, Gandersheim ocupou uma alta posição, quando
alcançou, por um decreto real, o título de principado independente, o que
significava que todos os habitantes da cidade, exceto os criados, passaram a
pertencer, por nascimento, à nobreza. A cidade passou a ter autonomia para
cunhar moedas, realizar julgamentos, responder diretamente ao papa, sem
intermédios e até ter seu próprio exército. Além disso, teria sido usado,
inclusive, como palácio do imperador durante um ano. Em Gandersheim, a
Imperatriz Theophanu trouxe ao mundo sua
terceira filha, Matilde, e deixou guardado seu arquivo pessoal. O Imperador Oto
obteve até um privilégio de proteção papal para o convento de Gandersheim, o
qual restringia a autoridade do soberano da diocese, o Bispo de Hildesheim
e assegurava às abadessas uma maior autonomia. A canonisa teve duas doutas
mestras: Rikkardis e Gerbig, filha de Heinrich von Bayern e sobrinha do Imperador Oto
I, que se tornou, em 959, abadessa do convento. Como professora, acompanhou
Rosvita, leu com ela os clássicos da Antigüidade e incentivou a jovem poetisa.
O poeta romano Terêncio tornou-se para Rosvita modelo e mestre. Com sua
obra, Rosvita formou seu espírito, seu estilo e seu latim. Além disso, em
Gandersheim, Rosvita tinha uma importante biblioteca
à sua disposição. A poetisa criou trabalhos, os quais são marcados por uma
profunda cultura clássica e uma formação formal. Quando Rosvita morreu é
desconhecido. Estima-se que tenha sido aproximadamente em 975. Ela é
representada com suas roupas de canonisa, uma cruz, um livro e uma pena. Seu
dia é comemorado em 5 de setembro.
Obra
Os relatos de
Rosvita apontam sempre para o esplendor no novo reino cristão e seu líder,
tendo a poetisa uma profunda compreensão dos problemas do mundo e da alma
humana. Sua obra inclui três tipos de trabalhos. Em latim, ela escreveu oito
lendas, seis peças de teatro e dois épicos. Rosvita criou as lendas a partir
das Escrituras
Sagradas, dos Evangelhos apócrifos ou de histórias de vidas de santos.
As peças de teatro foram escritas a partir do modelo
do escritor romano Terêncio, que também escreveu seis peças. Eles tratam da
vitória da fé e da pureza sobre o poder e a sedução. Trata-se de comédias
morais: Gallicanus (Galicano), Dulcitius (Dulcício), Callimachus (Calímaco),
Abraham, (Abraão), Paphnutius (Pafnúcio) e Sapientia (Sabedoria). Não se sabe
se tais esboços dramáticos foram alguma vez representados, se ela os escreveu
apenas como exercício literário, utilizado apenas para a distração de suas
companheiras do convento ou se tiveram um público maior, com uma encenação
propriamente dita. É possível que tenham sido realmente encenadas, mesmo as
peças com papéis infantis, pois em sua época crianças eram mandadas para os
conventos para serem educadas. Por exemplo, na peça Sapientia, na qual Rosvita
tem a preocupação de escrever as falas de acordo com a idade das personagens,
pois as crianças mais novas (as personagens infantis têm 8, 10 e 12 anos)
recebiam menos falas, mais curtas e mais fáceis. Entretanto, essa ainda é uma
questão sem resposta! Rosvita admirava Terêncio no aspecto formal, mas os temas
“indecentes” do poeta pagão, demasiado vãs e imorais para ela, levou a poetisa
“reformular” a temática, como a própria Rosvita se pronuncia:
Muitas vezes
enrubesci por ter de escrever a respeito da detestável loucura dos amores
ilícitos e de inconvenientes colóquios amorosos, coisas às quais não devemos
prestar atenção. Mas se, envergonhada, eu não tratasse desses assuntos, não
conseguiria atingir meu objetivo, que é o de celebrar o louvor das almas
inocentes. Na verdade, quanto maior parece a sedução dos amantes, tanto maior a
glória do auxílio divino. [1]
Ela coloca os
vilões e espertalhões de Terêncio ao lado de sagradas virgens, mártires e
piedosos eremitas, que contribuem para a sua edificação. Os protagonistas
sempre ganham a disputa contra os bem aparentados pagãos ou a luta contra os
vícios do mundo. Segundo a Enciclopédia Verbo Luso-Brasileira de
Cultura,(Editorial Verbo, 2000) suas tentativas de criar dramas cristãos na
Alemanha ficaram sem continuação até o humanismo.
Seus dois épicos
tratam de temas históricos: o primeiro, Gesta Oddonis relata os atos de
Otto I, que não é considerada uma das melhores obras de Rosvita, pois a autora
carecia das ferramentas necessárias para escrever um poema épico convincente .
O primeiro, Gesta Oddonis, vale como uma extraordinária pesquisa independente
sobre a dinastia otoniana. O Primordia
Coenobii Gandersheimensis, seu segundo épico, conta a história da fundação
do convento de Gandersheim. Rosvita achava difícil para uma mulher compor, por
causa da métrica. Ela esperava que a providência divina a ajudasse, mas quando
foi encarregada de escrever os feitos de Otto, o Grande (os Gesta Oddonis),
acabou por procurar a ajuda de sua mestra, a abadessa Gerbig. Ela confessa que
durante muito tempo escreveu em segredo, chegando muitas vezes a destruir o
trabalho feito.
A obra de
Rosvita revela uma personalidade atraente, mas limitada por sua incapacidade de
trabalhar sem a rigidez derivada dos métodos clássicos, que copiou de Terêncio.
A “voz forte de Gandersheim”, como se auto-intitulava, tentou adotar novas
idéias e sensibilidades a um modo de expressão mais antigo e mais rígido, mas
seu esforço não teve êxito total e tampouco chegou a fazer-se famosa. Parece
ter havido pouca influência sua durante a Idade
Média, ainda que suas obras tenham sido copiadas, porém, sem serem
atribuídas a ninguém. O simbolismo também está presente na obra da canonisa. Em
Dulcitius, por exemplo, Rosvita trabalha com o elemento do fogo, que é usado por Sisínio, sob
ordens do imperador Diocleciano para matar Ágape e Quiônia. O fogo, aqui, pode representar
o juízo de Deus,
como também sua grandeza e a força da castidade. Em uma outra peça de Rosvita,
Sapientia, os mártires passam por entre fogueiras e azeite ferventes e saem com
seus corpos ilesos, mostrando a superioridade de sua fé em relação à de seus
perseguidores Aqui também encontramos elementos ligados ao fogo e à dor e ao
sofrimento físico. Os dois últimos estarão presentes em todas as histórias que
têm como protagonistas santos tentados pelo Mal. Rosvita se inspira em vidas de
santos e mártires da Igreja para compor suas peças. Em Paphnutius, temos a
história da conversão da meretriz Taís. Essa foi a lenda que teve maior popularidade
na Idade Média. Originalmente composta, talvez no séc. V, foi traduzida para o
latim no séc. VI. Rosvita a dramatizou, juntamente com uma outra história, a de
Maria, sobrinha de um eremita, que, ao ser seduzida por um homem, se torna
meretriz e é resgatada da vida secular pelo eremita, em fins do séc. X. O
modelo da mulher que leva à perdição diversos homens devido à sua beleza e que
é convertida por um homem santo (em ambos os casos, um eremita) era bastante
comum e exerciam grande influência, enquanto exemplo de tentação vencida. “As
convertidas oferecem aos cristãos um exemplo de resgate através de uma
penitência dura e contínua, que permite anular as culpas da vida passada”. Já
no séc. XX, foram acrescentados 4 manuscritos à sua obra, reunida em uma ampla
coleção copiada pouco depois de sua morte e descoberta em fins do séc. XV por
um humanista alemão no convento de St. Emmeran, em Ratisbona,
onde a abadessa, que era amiga de Rosvita, havia se educado.
Ligações
externas
Referências
1.
LAUAND, Jean Luiz. Educação, teatro e matemática
medievais. São Paulo: Perspectiva, 1986. p. 31.
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