SÃO JERÔNIMO (Eusebius Sophronius Hieronymus) (331 - 420)
Em latim:
Eusebius
Sophronius Hieronymus; em grego: Εὐσέβιος Σωφρόνιος Ἱερώνυμος), também conhecido por Jerônimo de Estridão,
foi um sacerdote cristão ilírio (povo sul da Itália,
oeste dos Bálcãs) [1], destacado como teólogo e historiador e considerado confessor e Doutor da Igreja pela Igreja
Católica. Filho de Eusébio, da cidade de Estridão, na fronteira entre a Dalmácia
e a Panônia, é mais conhecido por sua
tradução da Bíblia para o latim
(conhecida como Vulgata) e por seus
comentários sobre o Evangelho
dos Hebreus, mas sua lista de obras é extensa[2].
Reconhecido
como santo pelos católicos, ortodoxos
e anglicanos e sincretizado como o orixá Xangô na umbanda. Não é tido como
santo para os luteranos, pelo fato de estes não canonizarem personalidades.[3][4]
Biografia
Eusébio
Sofrônio Jerônimo nasceu em Estridão por volta de 347 [5], mas só foi batizado
entre 360 e 366 quando viajou para Roma com seu amigo Bonoso - que pode ou não ser o mesmo Bonoso que Jerônimo
identifica como sendo seu companheiro quando foi viver como eremita numa ilha no Adriático - para continuar seus
estudos sobre retórica e filosofia. Lá, Jerônimo estudou com o gramático Élio Donato, aprendeu latim e um
pouco de grego[6], embora não tenha
adquirido a proficiência que, anos depois, alegaria ter obtido como estudante [7].
Ainda
como estudante em Roma, Jerônimo se envolveu no comportamento errático dos
colegas mais despreocupados, o que lhe provocava depois terríveis ataques de
arrependimento. Para apaziguar a consciência, visitava aos domingos as
sepulturas dos mártires e dos
apóstolos nas catacumbas, uma
experiência que lhe lembrava dos terrores do inferno:
“Frequentemente me encontrava entrando
naquelas profundas criptas escavadas na terra, com suas paredes de ambos os
lados preenchidas com os corpos dos mortos, onde tudo era tão escuro que
parecia quase como se as palavras do salmista tivessem se realizado: «Desçam
vivos ao Cheol (Seol hebraico, região dos mortos)» (Salmos 55:15). Aqui e ali, a luz, não vinda de janelas, mas
descendo através das valas, aliviava o horror da escuridão. Mas novamente, tão
logo você se via caminhando cuidadosamente adiante, a noite escura se fechava a
sua volta e vinha-me à mente o verso de Virgílio: "Horror ubique
animos, simul ipsa silentia terrent" Este prefácio às Escrituras podem
servir como uma introdução defensiva para todos os livros que traduzimos do
hebraico para o latim, para que possamos estar seguros que o que ficou de fora
deve ser deixado de lado como obras apócrifas.” — Jerônimo, Comentários sobre Samuel [18]
Jerônimo
utilizou de uma passagem de Virgílio — "Por todos os lados o horror se
espalhava; o profundo silêncio inspirava o terror na minh'alma"[10] — para descrever o
horror do inferno. No início de sua carreira, ele utilizava termos de autores
clássicos para descrever conceitos cristãos (como "Cheol", um termo
para o inferno) , um indicativo de sua educação clássica. Embora inicialmente
cético em relação ao cristianismo,
no fim acabou se convertendo [11]. Depois de muitos anos
na capital imperial, Jerônimo viajou com Bonoso para a Gália e se assentou em Augusta
dos Tréveros (moderna Tréveris, na Alemanha), onde é
possível que tenha 1.º se dedicado aos seus estudos teológicos e, depois, a
copiar para seu amigo Tirânio Rufino o comentário do
doutor da igreja Hilário
de Poitiers sobre os "Salmos"
e o tratado "De Synodis". Depois disso, Jerônimo viveu vários
meses (pelo menos) ou, possivelmente, anos, com Rufino em Aquileia, onde fez muitos amigos
cristãos.
Alguns
deles o acompanharam quando ele partiu, por volta de 373, numa viagem através
da Trácia e da Ásia Menor até o
norte da Síria.
Em Antioquia, onde ficou por mais
tempo, dois de seus companheiros morreram e ele próprio ficou seriamente doente
mais de uma vez. Durante uma destas enfermidades (perto do inverno de 373-374),
Jerônimo teve uma visão
que levou-a a abandonar seus estudos seculares para dedicar-se completamente a Deus. Ele parece ter trocado uma grande quantidade de tempo
que dispendia no estudo dos clássicos para estudar a Bíblia, dirigido por Apolinário
de Laodiceia, que na época ensinava em Antioquia e ainda não dava
sinais de sua futura condenação por heresia (vide apolinarismo).
Tomando
por um súbito desejo de viver em penitência asceta, Jerônimo passou um tempo
no deserto de Cálcis,
para o sudoeste de Antioquia, uma região conhecida como "Tebaida Síria", onde moravam numerosos eremitas. Durante este período,
ele parece ter encontrado tempo para estudar e escrever. Lá também dedicou-se a
aprender pela primeira vez o hebraico,
sob a tutela de um judeu convertido e é possível que
ele tenha mantido correspondência com os judeo-cristãos de Antioquia. Por volta desta época, Jerônimo
contratou uma cópia de um "Evangelho Hebreu", do qual fragmentos
foram preservados em suas notas e que é hoje conhecido como "Evangelho
dos Hebreus", considerado o verdadeiro Evangelho
de Mateus pelos nazarenos
[12]. Depois disso, ele
próprio traduziu partes da obra para o grego [13].
De
volta em Antioquia em 378 ou 379, foi ordenado
pelo bispo
Paulino
de Antioquia, aparentemente contra sua vontade e sob a condição de
poder continuar sua vida asceta. Logo depois, viajou para Constantinopla para continuar
seus estudos sobre as Escrituras
com Gregório
Nazianzeno, o teólogo. Ele passou por volta de uns 2 anos por lá e
partiu novamente para Roma, onde passou os 3 anos seguintes (382-385) na corte
do papa Dâmaso I
e a liderança cristã da cidade. O motivo da viagem foi um convite para que
participasse do concílio
de Roma em 382 sobre assuntos bíblicos realizado para acabar com o cisma na Igreja de
Antioquia, que na época tinha mais de um patriarca
alegando ser o verdadeiro. Acompanhando um deles, Paulino, pretendia apoiá-lo
nos trabalhos, acabou se destacando junto ao papa e passou a exercer um
importante papel durante seus concílios.
Jerônimo
então recebeu diversos encargos em Roma e realizou ali uma revisão da Bíblia Latina (Vetus Latina)
baseando-se em manuscritos gregos do Novo Testamento. Ele também
atualizou o saltério
contendo o "Livro dos Salmos" que era na época utilizado em Roma
baseando-se na Septuaginta
grega. Embora não tenha ficado claro para ele na ocasião, a tradução de muito
do que depois se tornaria a Vulgata
latina demoraria ainda muitos anos e tornar-se-ia seu mais importante legado.
Em
Roma, Jerônimo estava rodeado por um círculo de mulheres bem-nascidas e
bem-educadas, incluindo algumas oriundas das mais nobres famílias patrícias romanas, como as viúvas
Leia,
Marcela e Paula, com suas filhas Blesila e Eustóquia. Como resultado da
crescente inclinação destas mulheres pela vida monástica, da indulgente
lascividade que imperava em Roma e mais a
crítica feroz de Jerônimo ao clero secular, que não poupava
ninguém, logo irrompeu um conflito contra o clero romano e seus aliados. Depois
da morte de Dâmaso,
seu patrono (10/12/384), Jerônimo foi forçado a abdicar de suas funções em Roma
quando um inquérito foi aberto pelos seus inimigos para investigar uma suposta
relação inapropriada entre ele e Paula.
Além
disso, sua condenação ao estilo de vida hedonista de Blesila levou-a a adotar práticas
ascetas que acabaram afetando sua saúde e a tornaram tão fraca fisicamente que
ela morreu apenas 4 meses depois de começar a seguir suas instruções. A maior
parte da população romana ficou enfurecida com Jerônimo, acusando-o de causar a
morte prematura de uma jovem tão altiva. Para piorar, sua insistência de que
Paula não deveria lamentar a morte dela e suas reclamações de que o luto por
ela era excessivo foram vistos como cruéis e polarizaram ainda mais a opinião
pública contra ele [14].
Jerônimo com Santa Paula e sua filha Eustóquia, duas de suas
principais devotas. Uma rica viúva, Paula deu condições para que Jerônimo pudesse
viver sem preocupações financeiras e se dedicasse aos estudos. Ela seguiu-o
depois para Belém e morreu com ele na Terra Santa.
1638-1640. Por Francisco
de Zurbarán, atualmente na Galeria
Nacional de Arte.
Em
agosto de 385, Jerônimo abandonou Roma definitivamente e voltou para Antioquia
com seu irmão Pauliniano
e diversos amigos; logo depois vieram Paula e Eustóquia, decididas a terminar
suas vidas na Terra Santa.
No inverno do mesmo ano, viajou com elas na função de conselheiro espiritual. O
grupo, acompanhado do bispo Paulino
de Antioquia, peregrinou por Jerusalém, Belém
e os lugares santos da Galileia
antes de seguir para o Egito,
onde viviam os heróis da vida asceta, os monges do deserto.
Na
Escola Catequética de Alexandria, Jerônimo ouviu o teólogo Dídimo, o Cego, ensinar sobre o profeta Oseias (séc. 8 a.C) e contar o que se lembrava de Santo Antão do deserto (251-356), que morrera 30 anos antes. Depois, passou algum
tempo na Nítria admirando a disciplinada
vida comunitária dos numerosos habitantes da "cidade do Senhor",
percebendo que, mesmo ali, "serpentes escondidas", ou seja, a
influência do polêmico teólogo alexandrino Orígenes de Cesareia. No final do
verão de 388, voltou para a Terra Santa e passou o resto de sua vida numa cela
eremítica perto de Belém rodeado por uns poucos amigos, homens e mulheres
(incluindo Santa Paula e Eustóquia),
a quem ele atendia como sacerdote e professor.
Com
recursos financeiros suficientes providenciados pela rica Paula, que investia
também em aumentar sua biblioteca, Jerônimo passou a levar uma vida de
incessante produção literária. A estes últimos 34 anos de sua carreira
pertencem suas mais importantes obras; sua versão do Antigo Testamento traduzida do
original hebraico, o melhor de seus comentários sobre as Escrituras, seu catálogo
de autores cristãos (De
Viris Illustribus) e o seu diálogo contra os pelagianos, de perfeição
reconhecida até pelos seus adversários. A este período também pertence a maior
parte de suas polêmicas,
obras que o distinguem dos demais Padres da Igreja da época,
incluindo tratados contra o origenismo
(crença que seria depois anatemizada)
do bispo
João II
de Jerusalém e de seu antigo amigo Rufino.
Em
416, como consequência de suas obras contra o pelagianismo, partidários
inflamados da crença invadiram os edifícios monásticos perto de onde vivia,
atearam-lhes fogo, atacaram os moradores e mataram um diácono, forçando Jerônimo a se
refugiar numa fortaleza nas imediações.
Jerônimo
morreu perto de Belém
em 30 de setembro de 420, uma data que aparece na "Crônica" do
escritor cristão e discípulo de Agostinho Próspero
da Aquitânia. Diz-se que seus restos, originalmente enterrados em
Belém, foram trasladados para a Basílica
de Santa Maria Maior, em Roma, embora outros locais no ocidente
também reivindiquem a posse de alguma relíquia relacionada ao santo.
Traduções e comentários
Tradições
artísticas sobre Jerônimo
Jerônimo
foi um acadêmico numa época que o título implicava fluência em grego, mas ele
sabia também alguma coisa de hebraico quando começou seu projeto de tradução.
Para reforçar seus conhecimentos, mudou-se para Jerusalém estudando os
comentários judaicos sobre as Escrituras. Paula, a rica aristocrata romana que
era uma de suas seguidoras, financiou sua estadia num mosteiro em Belém onde
ele pôde concluir sua tradução. O trabalho começou em 382, com a correção da
versão latina do Novo
Testamento utilizada na época, a Vetus Latina. Em 390, iniciou
a tradução da Bíblia
Hebraica a partir do original, tendo já traduzido algumas partes
utilizando a Septuaginta
grega originária de Alexandria.
Jerônimo acreditava que o Concílio de
rabínico de Jâmnia - da corrente principal do judaísmo
rabínico - havia rejeitado a Septuaginta como versão válida
das Escrituras judaicas por conta do que ele aferiu serem erros de tradução e
elementos heréticos helenísticos [15] [16]. O trabalho terminou
em 405.
Antes
da Vulgata de Jerônimo, todas as traduções do Antigo Testamento eram
baseadas na Septuaginta e não na Bíblia Hebraica. Porém, a decisão de
utilizar esta ao invés daquela, que era também uma tradução do hebraico, como
fonte foi contrária às recomendações da maioria dos cristãos de seu tempo,
incluindo Santo
Agostinho, que considerava a Septuaginta inspirada.
O consenso acadêmico moderno, porém, tem lançado dúvidas sobre o quanto
Jerônimo de fato conhecia de hebraico e muitos acreditam que, na realidade, a
"Hexapla" (edição em 6 versões
do antigo testamento por Orígenes) grega
teria sido a principal fonte para a tradução "iuxta Hebraeos"
de Jerônimo do Antigo Testamento [17].
Seus
comentários patrísticos
(pais
da igreja, séc 1-3d.C) se alinham de
forma muito próxima à tradição judaica e ele se entrega às sutilezas alegóricas e místicas
no estilo de Fílon
e da "Escola de
Alexandria". Ao contrário de seus contemporâneos, Jerônimo
enfatizava a diferença entre os apócrifos da Bíblia Hebraica e os
livros protocanônicos da Hebraica veritas
("verdeira [Bíblia] Hebraica"). Evidências disso aparecem em suas
introduções para os apócrifos salomônicos (como os "Salmos de
Salomão") e os livros de Tobias e Judite. Mais notável, porém, é
sua afirmação na introdução de seu comentário aos Livros de Samuel:
Este
prefácio às Escrituras podem servir como uma introdução defensiva para todos os
livros que traduzimos do hebraico para o latim, para que possamos estar seguros
que o que ficou de fora deve ser deixado de lado como obras apócrifas. — Jerônimo, Comentários
sobre Samue l[18]
Os
comentários de Jerônimo se dividem em 3 grupos principais:
·
Suas traduções ou versões de textos gregos de outros
autores, incluindo 14 homilias
sobre o Livro de
Jeremias e 14o sobre o Livro de Ezequiel de Orígenes
(traduzidas por volta de 380 em Constantinopla); 2 homílias de Orígenes sobre
os Salmos de
Salomão (em Roma, ca. 383); e
39 sobre o Evangelho
de Lucas (ca. 389 em Belém). As 9 homilias de Orígenes sobre
o Livro de
Isaías incluídas entre suas obras não são de sua autoria. Deve-se
mencionar aqui também, como uma importante contribuição para o estudo da topografia de Israel, sua obra "De
situ et nominibus locorum Hebraeorum", uma tradução com algumas
adições e algumas infelizes omissões do "Onomasticon" de Eusébio.
Ao mesmo período (ca. 390) pertence também a "Liber
interpretationis nominum Hebraicorum", baseada numa obra que
supostamente remontaria à época de Fílon
(filósofo
judeo-helenista 20 a.C.
— ca. 50]) e que foi expandida
por Orígenes.
·
Comentários originais sobre o Antigo Testamento. Ao período
anterior de sua mudança para Belém e aos cinco anos depois disso pertencem uma
série de curtos estudos sobre o Antigo Testamento: "De seraphim",
"De voce Osanna", "De tribus quaestionibus veteris
legis" (geralmente incluído entre suas epístolas, as de número 18, 20
e 36); "Quaestiones hebraicae in Genesim"; "Commentarius
in Eclésiasten"; "Tractatus septem in Psalmos 10-16"
(perdida); "Explanationes in Michaeam", "Sophoniam",
"Nahum", "Habacuc", "Aggaeum".
Depois de 395, ele compôs uma série de comentários mais longos e num tom mais
derrogatório: 1.º sobre Jonas
e Obadias
(396), depois sobre Isaías
(ca. 395 - ca. 400), Zacarias, Malaquias,
Oseias, Joel e Amós (a partir de 406), sobre Daniel (ca. 407), Ezequiel (entre 410 e 415) e Jeremias (depois de 415 e não
terminado).
·
Comentários sobre o Novo Testamento. Entre eles sobre
as epístolas a Filêmon,
Gálatas,
Efésios
e Tito
(escrita apressadamente entre 387 e 388); sobre Mateus
(ditada numa quinzena em 398), Marcos,
passagens selecionadas de Lucas,
do Apocalipse e do prólogo do João.
Obras
Obras históricas e hagiográficas
Jerônimo
também é conhecido como historiador. Uma de suas 1.ªs obras sobre o tema foi
sua Crônica
(ou ainda Temporum liber), escrita por volta de 380 quando ele estava em
Constantinopla. É uma tradução
para o latim das tabelas cronológicas da 2.ª parte da Crônica
de Eusébio de
Cesareia (265-339) com um
suplemento cobrindo o período entre 325 e 379. Apesar dos diversos erros,
alguns herdados de Eusébio e outros próprios, trata-se de uma obra valiosa,
menos pelo conteúdo e mais pelo impulso que proporcionou para cronistas
posteriores como Próspero
(séc.
5), e do séc. 6 Cassiodoro e Vítor de
Tununa, que continuaram complementando os anais.
Importante
também foi sua "De
Viris Illustribus", escrita em Belém em 392, com título e
arranjo emprestados da "Vida dos
12 Césares" de Suetônio. Ela contém breves notas
biográficas e lista de obras de 135 autores cristãos, de São Pedro até o próprio Jerônimo.
Para os 1.ºs 78, a
"História
Eclesiástica" de Eusébio é a fonte principal; no 2.º grupo,
começando com Arnóbio (255-327) e Lactâncio (250-325), Jerônimo incluiu uma boa quantidade de informações
independentes, especialmente para os autores ocidentais.
Jerônimo
escreveu ainda quatro obras de natureza hagiográfica (biografias de
santos):
·
A "Vita Pauli monachi", escrita durante sua primeira
passagem por Antioquia (ca. 376), na qual o material lendário deriva da
tradição monástica egípcia;
·
A "Vitae Patrum (Vita Pauli primi eremitae)",
uma hagiografia de São Paulo
de Tebas;
·
A "Vita Malchi monachi captivi" (ca. 391),
provavelmente baseada num trabalho anterior, apesar de se propor derivar das
conversas com o idoso asceta Malco com o
próprio Jerônimo no deserto de Cálcis;
·
A "Vita Hilarionis" (ca. 391), contendo
informações históricas mais confiáveis que as anteriores e baseada parcialmente
na biografia de Epifânio
e parcialmente na tradição oral.
O
chamado "Martyrologium
Hieronymianum" ("Martirológio de Jerônimo") é espúrio; ele foi aparentemente
composto por um monge ocidental no final do séc.
VI ou início do VII e faz referência a uma expressão de Jerônimo do 1.º
capítulo da "Vita Malchi", na qual ele fala de sua intenção de
escrever uma história dos santos e mártires da era apostólica.
Epístolas
As
epístolas de Jerônimo formam uma
importante porção do que restou de suas obras literárias, tanto pela enorme
variedade de temas quanto pela qualidade estilística. Independente de estar
discutindo os problemas do ensino acadêmico ou argumentando em casos de consciência,
reconfortando os aflitos ou apenas fazendo elogios aos amigos, atacando os
vícios e corrupções de sua época ou a imoralidade
sexual no clero [19], exortando à vida
asceta e a renúncia do mundo ou se digladiando com seus adversários, Jerônimo
apresenta uma imagem vívida não apenas de sua mente, mas de sua época com
características peculiares. Como não existia naquele tempo uma distinção entre
documentos pessoais e públicos, frequentemente encontramos em suas cartas tanto
confidências pessoais quanto tratados direcionados a terceiros lado a lado[20].
As
mais frequentemente republicadas ou citadas são as exortativas, como "Ad
Heliodorum de laude vitae solitariae" (Ep. 14), "Ad Eustochium
de custodia virginitatis" (Ep. 22), "Ad Nepotianum de vita
clericorum et monachorum" (Ep. 52), uma espécie de epítome de teologia pastoral do ponto de
vista ascético, "Ad Paulinum de studio scripturarum" (Ep. 53),
de mesmo objetivo, De institutione monachi (Ep. 57), "Ad Magnum
de scriptoribus eclésiasticis" (Ep. 70) e "Ad Laetam de
institutione filiae" (Ep. 107).
Obras teológicas
Praticamente
todas as obras de Jerônimo no campo do dogma tem um caráter polêmico de tom mais ou menos veemente,
direcionadas principalmente contra os defensores de doutrinas contrárias às ortodoxas.
Até mesmo a tradução de um tratado de Dídimo, o Cego, sobre o Espírito Santo para o latim (iniciada em Roma em 384 e completada em Belém) revela
uma tendência apologética
contra os arianos e os macedonianos ou pneumatomachoi. O mesmo vale
para sua versão para "De principiis", de Orígenes (ca.
399), cujo objetivo era sobrepujar a tradução incorreta de Rufino. Obras mais polêmicas, stricto sensu, foram escritas
em todos os períodos de sua vida, em diferentes contextos. Durante suas
passagens por Constantinopla e Antioquia, por exemplo, Jerônimo estava mais
preocupado com a controvérsia
ariana e, especialmente, com o cisma em Antioquia protagonizado
por Melécio
de Antioquia e Lúcifer
Calaritano. Duas cartas ao papa Dâmaso (Ep. 15 & 16)
trazem reclamações a ambos os partidos em disputa, os melecianos e os
paulinianos, que tentavam atraí-lo para a controvérsia sobre a relação entre Deus Pai e Deus Filho na Trindade
e, mais especificamente, à aplicação de termos como ousia (substância) e hipóstase a esta relação. Na
mesma época ou pouco depois (373), ele compôs sua "Liber Contra
Luciferianos", na qual ele utiliza o diálogo de forma bastante inteligente
para combater os princípios da facção dos calaritanos, principalmente sua
rejeição ao batismo realizado por heréticos (uma tese de cunho donatista, já rejeitada antes).
Em
Roma (por volta de 383), Jerônimo escreveu uma apaixonada resposta aos
ensinamentos de Helvídio
defendendo a doutrina da virgindade
perpétua de Maria e da superioridade da castidade sobre o matrimônio. Um adversário de
natureza similar foi Joviniano,
com quem debateu em 392 ("Adversus Jovinianum" e a defesa desta obra
endereçada ao seu amigo Pamáquio -
Ep. 48). Em 406, uma vez mais Jerônimo defendeu as práticas piedosas católicas
e sua própria ética asceta contra o presbítero gaulês Vigilâncio,
que era contrário à veneração
dos mártires e das relíquias, ao voto de pobreza e ao celibato clerical. Em paralelo,
participou ainda da controvérsia com João II
de Jerusalém e Rufino sobre a ortodoxia do origenismo. A este período
pertencem algumas de suas mais apaixonadas e completas obras polêmicas: a "Contra
Joannem Hierosolymitanum" (398 ou 399); duas obras intimamente
relacionadas, "Apologiae contra Rufinum" (402) e sua
"última palavra", escrita poucos meses depois, "Liber tertius
seu ultima responsio adversus scripta Rufini".
A
última obra polêmica de Jerônimo foi sua "Dialogus contra
Pelagianos" (415), contra a heresia do pelagianismo.
Legado
Jerônimo
é o segundo autor mais prolífico do cristianismo antigo tardio (depois de Santo Agostinho). Na Igreja
Católica, ele é reconhecido como santo padroeiro dos tradutores,
bibliotecários e enciclopedistas[21].
Arte
Na
arte, Jerônimo geralmente aparece representado como um dos quatro doutores latinos, juntamente com Santo Agostinho, Santo Ambrósio e São
Gregório Magno. Como um membro proeminente do clero romano, ele foi
muitas vezes representado - anacronisticamente - com o hábito vermelho de cardeal. Mesmo quando ele aparece
representado como um anacoreta (monge cristão
heremita) semi-nu, com a cruz, a caveira
(símbolo da mortalidade) e a Bíblia como únicas mobílias de sua cela, o chapéu cardinalício ou outro
indicativo de sua posição de cardeal aparece, via de regra, em algum lugar da
obra.
Jerônimo
é também geralmente representado na companhia de um leão, uma referência a uma
conhecida lenda de como ele teria domado um leão ao curar um ferimento em sua
pata. A origem da história, quase idêntica à contada sobre São Gerásimo, foi possivelmente uma confusão entre os nomes
em latim dos dois santos, "Gerasimus" e "Geronimus"
[a] [b].
Hagiografias de Jerônimo contam que ele passou muitos anos nos desertos da Síria romana e diversos artistas
intitularam sua obras "São Jerônimo no Deserto", entre eles o pintor
italiano Pietro
Perugino (1450-1523) e o
holandês Lambert
Sustris (1515-1584) [22].
Ele
é por vezes também representado com uma coruja, o símbolo da sabedoria e
da erudição [23]. Finalmente, a iconografia de São Jerônimo
inclui ainda materiais de escrita (pena, tinteiro, papel etc.) e a trombeta do Juízo Final.[23].
Ver também
Notas
[a] ^ Eugene Rice sugeriu que, com toda certeza, a história do leão
de Gerásimo se ligou à Jerônimo em algum momento no séc. VII, depois que as
invasões militares árabes forçaram muitos monges gregos que viviam nos desertos
do Oriente Médio a buscarem refúgio em Roma. Rice conjectura[24] que, "por
causa da similaridade entre os nomes 'Gerasimus' e 'Geronimus', este o nome
latino de Jerônimo, um sacerdote também latino tornou São Jerônimo o herói da
história que ele havia ouvido sobre São Gerásimo; e que o autor da 'Plerosque
nimirum', atraído por uma história ao mesmo tempo tão pitoresca, tão
aparentemente apropriada e tão ressonante em significado e sugestionamento; e
sob a impressão de que ela teria origem em histórias que peregrinos teriam ouvido
em Belém, incluiu-a em sua 'vida' de
um santo favorito que, não fosse assim, não realizara milagres"[25].
[b] ^ Uma reminiscência desta história
pode ser encontrada na "Legenda Áurea" (séc. XIII),
de Jacobus de
Voragine[26]
Referências
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Schaff, Philip,
ed. (1893). A Select Library of
Nicene and Post-Nicene Fathers of the Christian Church. Col: 2nd series. VI.
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em 7 de junho de 2010
5.
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6.
Walsh, Michael, ed. (1991). Butler's Lives of the
Saints. New York:
HarperCollins. p. 307
7.
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Life, Writings, and Controversies. New
York: Harper & Row. pp. 13–14
8.
Jerome. Commentarius in
Ezzechielem. [S.l.: s.n.] c. 40, v. 5
9.
Patrologia Latina 25, 373:
Crebroque cryptas ingredi, quae in terrarum profunda defossae, ex utraque parte
ingredientium per parietes habent corpora sepultorum, et ita obscura sunt
omnia, ut propemodum illud propheticum compleatur: Descendant ad infernum
viventes (Ps. LIV,16): et raro desuper lumen admissum, horrorem temperet
tenebrarum, ut non tam fenestram, quam foramen demissi luminis putes: rursumque
pedetentim acceditur, et caeca nocte circumdatis illud Virgilianum proponitur
(Aeneid. lib. II): "Horror ubique animos, simul ipsa silentia terrent."
11.
Payne, Robert (1951). The
Fathers of the Western
Church. New York: Viking. p. 91
12.
Rebenich, Stefan (2002).
Jerome. [S.l.: s.n.] p. 211
13.
Pritz, Ray (1988). Nazarene
Jewish Christianity: from the end of the New Testament. [S.l.: s.n.] p. 50
14.
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15.
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Translations - The Septuagint».
JewishEncyclopediaCom.
Consultado em 10 February 2012 Verifique
data em:
|acessodata=
(ajuda)
16.
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Services"». Lis.luther.edu.
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gallery of the religious art collection of New Mexico State
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24.
Saint Jerome in the Renaissance, pp. 44-45
25.
Salter, David. Holy and
Noble Beasts: Encounters With Animals in Medieval Literature.
[S.l.]: D. S. Brewer. p. 12. ISBN 9780859916240
26. Williams,
Megan Hale. The Monk and the Book: Jerome and the Making of Christian
Scholarship. Chicago:
U of Chicago P. p. 1. ISBN 978-0-226-89900-8
Bibliografia
·
J.N.D. Kelly, "Jerome: His
Life, Writings, and Controversies" (Peabody, MA 1998)
·
S. Rebenich, "Jerome" (London and New
York, 2002)
·
"Biblia
Sacra Vulgata," Stuttgart, 1994. ISBN 3-438-05303-9
·
Este artigo se utiliza de inf. da Schaff-Herzog Encyclopedia of Religious
Knowledge, de 1914, que está em domínio
público.
·
Saint Jerome, Three
biographies: Malchus, St. Hilarion and Paulus the First Hermit Authored by Saint Jerome, London,
2012. limovia.net. ISBN 978-1-78336-016-1
Ligações externas
·
"St. Jerome" na edição de 1913 da Enciclopédia
Católica (em inglês)., uma publicação agora em domínio
público
·
Este
artigo incorpora texto da Enciclopédia
Judaica (Jewish Encyclopedia) (em inglês) de 1901–1906 (artigo
"Jerome"), em domínio
público.
·
«São Jerônimo» (em inglês).
Catholic Online
·
«São Jerônimo» (em inglês).
Orthodox Church in America
·
«Iconografia de São Jerônimo» (em
inglês). Christian Iconography
·
«São Jerônimo na Legenda Áurea» (em inglês). Christian Iconography
·
Migne, ed. (1844-1855). Patrologia Latina
. Opera Omnia (em latim). [S.l.: s.n.]
·
«Prefácios e Comentários sobre Daniel, Crônicas e a Ep. 120»
(em inglês). Tertullian
·
«Carta de Jerônimo ao Papa Dâmaso: Prefácio
aos Evangelhos» (em inglês). Tertullian
·
«Sobre a Virgindade Perpétua de Maria»
(em inglês). Christian Classics Ethereal Library
·
«De
Viris Illustribus» (em inglês). Christian Classics Ethereal
Library
·
«Contra Rufino» (em inglês).
Christian Classics Ethereal Library
·
«Epístolas» (em inglês). Christian
Classics Ethereal Library
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