quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

TÁCITO (55 - 120)



TÁCITO (Cornelius Tacitus)  (55 - 120)

Públio Cornélio Tácito ou Caio Cornélio Tácito (lat.: Publius/Gaius Cornelius Tacitus; c. 56 – c. 117) foi um senador e historiador romano. As porções sobreviventes de suas 2 maiores obras - "Anais" e "Histórias" - tratam dos reinados dos imperadores Tibério, Cláudio, Nero e os imperadores do ano dos 4 imperadores (69), um período de tempo que se estende da morte de Augusto, em 14, até a 1.ª guerra romano-judaica em 70. Há muitas lacunas nos textos, incluindo uma em "Anais" que corresponde a 4 livros inteiros.

As outras obras de Tácito discutem oratória (no formato de diálogo, "Diálogo dos Oradores"), a Germânia (em De origine et situ Germanorum) e a vida de seu sogro, Cneu Júlio Agrícola, o famoso general romano responsável por boa parte da conquista romana da Britânia ("De vita et moribus Iulii Agricolae").

Tácito é considerado um dos grandes historiadores romanos [1][2], um dos grandes representantes da Idade da Prata da literatura latina, e é conhecido tanto por sua concisão e pela forma compacta de sua prosa em latim quanto pelos seus penetrantes insights sobre os jogos de poder na política romana de sua época.

Os "Anais" são um dos 1.ºs registros históricos seculares a mencionarem Jesus Cristo, que Tácito menciona em relação às perseguições aos cristãos de Nero — veja Tácito e os cristãos.

Vida

Detalhes sobre sua vida pessoal são escassos. O pouco que se sabe é inferido a partir de pistas espalhadas por toda a sua obra, das cartas de seu amigo e admirador Plínio, o Jovem, e de uma inscrição encontrada em Milasa, na Cária [3].

Nasceu entre 56 ou 57 em uma família equestre [nota 1] em alguma das províncias do norte da Itália ou na Gália Narbonense. O local exato e a data do nascimento são desconhecidos e até mesmo o seu praenomen (1.º nome) é incerto; nas cartas de Sidônio Apolinário, é "Caio" (Gaius), mas no maior manuscrito sobrevivente de sua obra o seu nome é "Públio" (Publius). Uma opinião acadêmica sugerindo "Sexto" (Sextus) não obteve aprovação dos pares [nota 2].

Família e 1.ºs anos

A maior parte das antigas famílias aristocráticas romanas não sobreviveu às sucessivas proscrições ocorridas no final da República e Tácito deixa claro que ele devia seu status aos imperadores flavianos [7]. A tese de que ele seria descendente de um liberto deriva de um discurso preservado em sua obra que afirma que muitos senadores e equestres eram descendentes de libertos [8], mas é geralmente disputada [9] [10].

Estátua de Tácito no Parlamento de Viena, Áustria.

Seu pai pode ter sido o Cornélio Tácito que serviu como procurador da Gália Bélgica e Germânia; Plínio, o Velho, menciona que este Cornélio teve um filho que "envelheceu rapidamente"[11], o que geralmente significa que morreu jovem. Não há menção de Tácito ter sofrido uma doença similar a esta, mas é possível que seja uma referência a um irmão se Cornélio de fato for o seu pai [12][13][14]. A amizade entre Plínio, o Jovem, e Tácito levou alguns estudiosos a sugerirem que eles eram ambos filhos de ricas famílias provinciais [15].

A província de seu nascimento permanece indeterminada, embora várias conjecturas sugiram Gália Bélgica, Gália Narbonense ou Gália Cisalpina [16][17]. Seu casamento com a filha de um senador narbonense, Cneu Júlio Agrícola, favorece a tese de que ele veio daquela província. A dedicação de "Dialogus" a Lúcio Fábio Justo, por outro lado, pode indicar uma relação com a Hispânia e, finalmente, sua amizade com Plínio sugere a Gália Cisalpina[18]. Contudo, não há evidências de que os amigos de Plínio no norte da Itália conhecessem Tácito e nem as cartas de Plínio sugerem que os tiveram um passado comum [19]. O próprio Plínio (livro 9, Carta 23) relata [20] que, quando foi perguntado se ele era italiano ou provincial, ele deu uma resposta ambígua e recebeu de volta a pergunta se ele falava de Tácito ou dele próprio. Como Plínio era italiano, alguns inferem, com base nisto, que ele era provavelmente oriundo da Gália Narbonense [21] [22].

Sua ancestralidade, sua habilidade oratória e seu tratamento simpático em relação aos bárbaros que resistiam ao jugo romano [23] são características que levaram alguns a sugerirem que ele era de origem celta, os ocupantes da Gália antes da chegada dos romanos e famosos por sua oratória[24][25].

Vida pública, casamento e carreira literária

 

Ainda jovem, Tácito estudou retórica [26] em Roma para se preparar para uma carreira em direito e na política. Como Plínio, é possível que também tenha estudado com Quintiliano [27] [28]. Em 77 ou 78, Tácito se casou com Júlia Agrícola, filha do famoso general Cneu Júlio Agrícola [29]. Pouco se sabe da vida doméstica do casal, exceto que Tácito adorava caçar e o campo[30] [31] [32]. Sua carreira começou depois que ele foi admitido no Senado Romano (adlectio) 33] [34] por Vespasiano [35] e seu 1.º cargo foi o de questor em 81 ou 82, no reinado de Tito [35]. Como esperado, Tácito avançou gradualmente pelo cursus honorum, tornando-se pretor em 88; na mesma época, foi admitido entre os quindecênviro dos fatos sagrados, um dos mais prestigiosos colégios sacerdotais de Roma [nota 3]. Além disto, Tácito também foi ganhando fama como advogado e orador.

Depois do pretorado, Tácito serviu nas províncias entre 89 e 93, seja como tribuno de uma legião ou num posto civil [nota 4] [40] [41] [42] [43] [44]. Tácito conseguiu sobreviver às perseguições durante o reinado de Domiciano (r. 81-96) com sua fortuna intacta, mas a experiência o deixou exausto e possivelmente um pouco envergonhado de sua própria cumplicidade, traços evidentes no ódio à tirania atestado em suas obras [45] [46]. Uma citação de "Agrícola" é ilustrativa:

“Agrícola foi poupado naqueles anos finais durante os quais Domiciano, sem deixar intervalo no tempo ou espaço para respirar, mas, como se sabe, com um golpe contínuo drenou a energia vital do estado. [...] Não demorou para que nossas mãos arrastassem Helvídio para a prisão, antes que observássemos o semblante moribundo de Manrico e Rústico, antes que nos manchássemos no sangue inocente de Senécio. Até mesmo Nero virou os olhos e não contemplou as atrocidades ordenadas; com Domiciano, a parte principal de nossa miséria era ver e ser visto, saber que a nossa visão estava sendo gravada.”— Tácito, Agrícola 44-45 [47]

No começo do reinado de Nerva (97), Tácito foi nomeado cônsul sufecto, o 1.º de sua família a chegar ao posto. Durante seu mandato, atingiu o ápice de sua fama como orador quando discursou no funeral do famoso general Lúcio Vergínio Rufo [48].

No ano seguinte, escreveu e publicou "Agrícola" e "Germânia", os 1.ºs passos de uma carreira literária que ocuparia seus anos finais [nota 5], e anuncia sua retirada da vida pública, que, contudo, seria retomada durante o reinado de Trajano (r. 98-117). Em 100, ele e Plínio processaram Mário Prisco, ex-procônsul da África, por corrupção. Ele foi considerado culpado e exilado. Plínio escreveu poucos dias depois que Tácito havia falado "com toda majestade que caracteriza seu estilo usual de oratória" [51].

Uma longa ausência da política e do direito se seguiu enquanto ele escrevia "Histórias" e "Anais". Em 112 ou 113, Tácito foi nomeado para um dos dois mais altos disponíveis para a carreira senatorial, o de procônsul da Ásia (o outro é o de procônsul da África), como atesta uma inscrição encontrada em Milasa, na Cária. Uma passagem em "Anais" fixa 116 como terminus post quem para sua própria morte, que pode ter sido em datas tão distantes quanto 125 ou até mesmo 130[nota 6]. Ele sobreviveu a Plínio (m. 113) e, possivelmente, Trajano (m. 117)[16][58]

Permanece incerto se Tácito teve filhos. A "História Augusta"[59] menciona que o imperador Marco Cláudio Tácito (r. 275-276) alegava ser um descendente de Tácito e ordenou que suas obras fossem preservadas, mas esta história pode ser mais uma invenção do autor desta obra [nota 7]. Sidônio Apolinário [62] relata que Polêmio, um aristocrata galo-romano, é descendente de Tácito, mas o historiador Ronald Syme afirma que esta alegação é pouco crível [61].

Obras

Cinco obras atribuídas a Tácito sobreviveram (com lacunas). As datas são aproximadas:

 

Anais e Histórias

Ver artigos principais: Histórias e Anais

Os "Anais" e as "Histórias", publicados separadamente, tinham como objetivo formar uma única edição com 30 livros [nota 8]. Apesar de "Histórias" ter sido escrita antes de "Anais", os eventos desta precedem os daquela; juntas elas forma uma narrativa que vai da morte de Augusto (14) até a morte de Domiciano (96). Apesar de a maior parte ter se perdido, o que restou é um registro inestimável da história do séc. I em Roma. A 1.ª metade dos "Anais" sobreviveu num único manuscrito da Abadia de Corvey e a 2.ª, num único manuscrito da Abadia de Monte Cassino, o que torna incrível que a obra tenha sobrevivido.

Capa de uma edição de "Germânia" (1536)./ Capa de uma edição das obras completas de Tácito em 1598. Final do livro 11 e começo do livro 12 de "Anais" (séc. XI).

No 1.º capítulo de "Agrícola", Tácito afirma que queria escrever sobre os anos de Domiciano, Nerva e Trajano. Nas "Histórias", o escopo mudou; Tácito afirma que irá tratar dos reinados destes dois últimos em uma obra posterior e tratou de cobrir o período que vai da guerra civil conhecida como Ano dos 4 imperadores até o final despótico da dinastia flaviana. Apenas os 1.ºs quatro livros e 26 capítulos de um 5.º sobreviveram, cobrindo o ano de 69 e a primeira parte de 70. Acredita-se que obra teria continuado até a morte de Domiciano em 18/09/96. O 5.º livro contém — como prelúdio ao relato da supressão da Grande Revolta Judaica por Tito — uma curta análise etnográfica dos judeus antigos e é um registro inestimável da atitude romana em relação a eles.

Tácito escreveu pelo menos 16 livros dos "Anais", mas os livros 7 - 10 e partes dos livros 5, 6, 11 e 16 se perderam. O livro 6 termina com a morte de Tibério e os livros 7 - 12 presumivelmente cobriram os reinados de Calígula e Cláudio. Os livros restantes tratam do reinado de Nero, talvez até sua morte em junho de 68 ou até o final daquele ano como ligação com o começo de "Histórias", mas não sabemos por que a 2.ª metade do livro 16 se perdeu, terminando com os eventos de 66. Também não se sabe se Tácito chegou a completar a obra. Ele certamente morreu antes de conseguir completar seu plano de escrever sobre os reinados de Nerva e Trajano e não há registros de uma obra sobre o reinado de Augusto ou do começo do Império Romano, que ele planejava escrever depois. Os "Anais" são um dos 1.ºs registros históricos seculares a mencionarem Jesus Cristo, que Tácito menciona em relação às perseguições aos cristãos de Nero — veja Tácito e os cristãos.

Germânia

Ver artigo principal: Germânia

"Germânia" (em latim: De Origine et situ Germanorum) é uma obra etnográfica sobre as tribos germânicas que viviam fora do Império Romano e se encaixa numa tradição etnográfica clássica que inclui autores como Heródoto e Júlio César. O livro começa (capítulos 18 - 27) com uma descrição das terras, leis e costumes das várias tribos. Os capítulos finais focam na descrição das próprias tribos, começando com as que viviam mais perto do Império e terminando com uma descrição das que viviam na costa do mar Báltico, como os fenni. Em "Agrícola", Tácito escreveu um texto similar, mas mais curto (capítulos 10 - 13).

Cneu Júlio Agrícola

Ver artigo principal: Agrícola

"Agrícola" (lat.: De vita Iulii Agricolae) é uma biografia de Cneu Júlio Agrícola, um proeminente general romano e sogro de Tácito. A obra cobre também, de forma breve, a geografia e a etnografia da antiga Britânia romana. Como em "Germânia", Tácito contrasta favoravelmente a liberdade dos nativos britanos com a tirania e a corrupção do Império. Além disso, a obra contém também eloquentes polêmicas contra a cobiça romana, que termina afirmando que "saquear, assassinar e usurpar com base em mentiras, eles chamam de Império; e onde criam um deserto, eles chamam de paz" (lat.: Auferre trucidare rapere falsis nominibus imperium, atque ubi solitudinem faciunt, pacem appellant), um trecho de um discurso que Tácito afirma ser do líder britano Calgaco.

Diálogo dos Oradores

Ver artigo principal: Diálogo dos Oradores

Não há certeza de quando Tácito escreveu "Diálogo sobre Oratória" (lat.: Dialogus de oratoribus). Muitas características do texto o diferenciam das outras obras dele e, por isso, sua autenticidade tem sido questionada. É provável que seja uma obra mais antiga, da época de seus estudos sobre retórica, especialmente por causa de seu estilo, que imita principalmente o do famoso orador Cícero. Ela não tem (por exemplo) as incongruências que são típicas de sua obra histórica mais madura. Ela foi dedicada a Lúcio Fábio Justo, governador da Síria e cônsul sufecto em 102.

Fontes

Em suas obras, Tácito utilizou as fontes oficiais do estado romano: as acta senatus (minutas das sessões do Senado) e as acta diurna populi Romani (uma coleção de atos de governo e notícias da corte e da capital). Ele também leu coleções de discursos dos imperadores, como de Tibério e Cláudio. Ele é geralmente tido como um historiador escrupuloso que tomava muito cuidado com suas fontes. As incoerências menores em "Anais" podem ser por causa de sua morte prematura antes do revisão final do texto.

Ele cita algumas fontes diretamente, entre elas Clúvio Rufo (político e historiador romano), Fábio Rústico (um historiador e amigo de Sêneca) e Plínio, o Velho, que havia escrito "Bella Germaniae" e uma obra histórica que era continuação do texto de Aufídio Basso (historiador do tempo de Tibério). Tácito utiliza também coleções de cartas (lat.: epistolarium) e informações da "exitus illustrium virorum", uma coleção de livros de pessoas consideradas adversárias dos imperadores e que tratam de sacrifícios de mártires da liberdade, especialmente pessoas que cometeram suicídio. Apesar de considerar sem valor a teoria estoica do suicídio, de considerar o suicídio uma ostentação do próprio valor e uma tática politicamente inútil, Tácito frequentemente dá bastante importância para discursos feitos pelos que estavam prestes a se matar, como foi o caso do historiador  Crementius Cordius (morto em 25), citado em "Anais"[65].

Estilo literário

As obras de Tácito são conhecidas por sua densa prosa que raramente minimiza os fatos, um contraste com o estilo de alguns de seus contemporâneos, como Plutarco. Quando ele escreveu sobre uma quase-derrota do exército romano em "Anais"[66], ele o faz com brevidade e sem embelezamentos desnecessários. Na maioria de suas obras, ele mantém a ordem narrativa cronológica, raramente revelando um contexto mais amplo e deixando que o leitor construa este contexto por si mesmo. Apesar disto, quando o faz, por ex. nos parágrafos iniciais de "Anais", utiliza poucas frases condensadas que levam o leitor direto ao centro da história.

Abordagem histórica

O estilo histórico de Tácito deve muito a Salústio. Sua historiografia oferece insights penetrantes — geralmente pessimistas — da psicologia da política de poder, misturando descrições de eventos, lições de moral e relatos dramáticos bem focados. Sua própria declaração a respeito de sua abordagem histórica é bem conhecida: "meu objetivo é relatar [...] sem nem raiva e nem zelo, motivos dos quais estou muito distante" (lat.: "inde consilium mihi ... tradere ... sine ira et studio, quorum causas procul habeo")[67].

Tem havido muito debate acadêmico sobre a "neutralidade" de Tácito. Por toda sua obra, ele se preocupa com o balanço de poder entre o Senado e os imperador e com a crescente corrupção das classes sociais governantes de Roma conforme elas se ajustavam com a sempre crescente riqueza e o inigualável poder do Império. Na opinião de Tácito, os senadores desperdiçaram sua herança cultural — a liberdade de expressão — para aplacar os (raramente bondosos) imperadores.

Ele notou a crescente dependência do imperador da boa vontade de seus exércitos. Os júlio-claudianos eventualmente cediam a seus generais, que seguiram Júlio César (e Sula e Pompeu) ao reconhecer que o poderio militar poderia assegurar o poder político em Roma:

“Tão bem-vinda quanto a morte de Nero havia sido numa primeira explosão de alegria, mas ainda sem levantar variadas emoções em Roma, entre senadores, o povo ou na soldadesca na capital, ela também excitou todas as legiões e seus generais; pois agora havia sido divulgado o segredo do Império, que imperadores podem ser feitos em outros lugares que não Roma.” Tácito, Histórias I.4[68]

A carreira política de Tácito foi vivida principalmente na época de Domiciano. Esta experiência de tirania, corrupção e decadência desta era (81-96) pode explicar a amargura e a ironia de sua análise política. Ele direciona a atenção do leitor para os perigos do poder sem prestação de contas, do amor ao poder sem princípios e da apatia e corrupção engendradas pelas concentração das riquezas geradas pelo comércio e pelas conquistas do Império.

Apesar disto, a imagem que ele constrói de Tibério nos 6 1.ºs livros de "Anais" não é exclusivamente sombria e nem recebe sua aprovação: a maior parte dos estudiosos a avaliam como predominantemente "positiva" nos 1.ºs livros e predominantemente "negativa" depois do relato das intrigas de Lúcio Élio Sejano (soldado e amigo confidente de Tibério). A apresentação de Tibério nos 1.ºs capítulos do 1.º livro é dominada pelo que Tácito vê como hipocrisia do novo imperador e seus aliados em relação aos senadores. Nos livros finais, algum respeito é evidente, especialmente pela inteligência do idoso imperador em assegurar sua própria posição.

No geral, Tácito não teme elogiar e nem criticar a mesma pessoa, geralmente notando o que ele acredita ser as mais e as menos admiráveis características das pessoas. Uma das marcas registradas de Tácito é evitar tomar posições de forma conclusiva a favor ou contra as pessoas que ele descreve, o que levou variados autores a interpretarem suas obras como sendo tanto a favor como contra o sistema imperial (em oposição ao republicano) — veja Estudos taciteanos, tacitistas "vermelhos" vs. "pretos").

Estilo de prosa

O latim de Tácito é muito elogiado [69] e seu estilo, embora tenha grandeza e eloquência (graças à sua educação retórica), é extremamente conciso e até mesmo epigramático — as sentenças raramente fluem ou são belas, mas seus pontos são sempre claros. Este estilo tem sido descrito ainda como "duro, desagradável e espinhoso" e "grave, conciso e vigorosamente eloquente".

Uma passagem de "Anais" (I.1), na qual Tácito lamenta o estado da historiografia sobre os quatro últimos imperadores da dinastia júlio-claudiana ilustra seu estilo:

Tiberii Gaique et Claudii ac Neronis res
florentibus ipsis—ob metum—falsae,
postquam occiderant—recentibus odiis—compositae sunt.

Os atos de Tibério, Caio e Cládio e também os de Nero
enquanto vivos — por causa do medo — eram falsos,
depois que morreram — com um ódio recente — foram escritos.


(pontuação e quebras de linhas adicionadas para aumentar a clareza)

Comparado com os autores da Idade de ouro da literatura latina, do período de Cícero, quando as sentenças geralmente tinham o comprimento de um parágrafo e eram artisticamente construídas com pares aninhados de frases sonoras cuidadosamente combinadas, o estilo de Tácito é curto e direto ao ponto. Mas é também bastante individual. Há três formas de dizer "e" na primeira frase (-que, et e ac) e especialmente a combinação da segunda e 3.ª linhas. Elas são paralelas no sentido e não no som; os pares de palavras terminando em "...-entibus ...-is" são colocadas numa forma que rompem deliberadamente com as convenções ciceronianas — com as quais o leitor teria que estar familiarizado para perceber a novidade do estilo de Tácito. Alguns leitores, no passado e hoje, acham este constante jogo de expectativas meramente irritante. Outros, percebendo a ruptura deliberada, jogando contra o evidente paralelismo das duas linhas, estimulante e intrigante [70].

Suas obras histórias focam nas motivações internas dos personagens, mas é questionável o quanto a percepção de Tácito esta correta e o quanto esta motivação é mais convincente apenas por causa da habilidade retórica de Tácito [71]. Ele está no seu melhor quando expõe hipocrisia e dissimulações, como quando ele conta como Tibério recusou o título de pater patriae e, logo em seguida, relembra a instituição de uma lei que proibia qualquer discurso ou obras "traidores" — e a quantidade de execuções frívolas que resultaram dela [72]. Em outra parte, Tácito compara a distribuição pública de ajuda humanitária de lenha ao seu fracasso em impedir as perversões e abusos de poder que ele próprio havia iniciado [73]. Apesar deste tipo de insight tenha lhe valido elogios, Tácito também foi criticado por ignorar o contexto mais amplo dos fatos.

Tácito deve muito, na linguagem e no método, a Salústio e Amiano Marcelino (330-400) é o historiador posterior cujo estilo mais se aproxima ao seu.

Estudos e legado

Ver artigo principal: Estudos taciteanos

É conhecida a frase de Plínio, o Jovem, sobre Tácito [74]: “Eu prevejo, e minhas previsões não falham, que suas histórias serão imortais / Auguror nec me fallit augurium, historias tuas immortales futuras.”

Tácito não foi muito lido na Antiguidade Tardia e ainda menos na Idade Média, como revelam a ínfima quantidade de manuscritos que preservaram suas obras [75]. Sua antipatia em relação a judeus e cristãos de sua época — ele relata com condescendência sem emoções o sofrimento deste últimos em Roma durante a perseguição de Nero — fizeram dele um autor impopular. Ele foi redescoberto, porém, durante o Renascimento, cujos autores ficaram impressionados com sua apresentação dramática da época imperial.

Ele tem sido descrito como "o maior historiador que o mundo romano já produziu" [76]. A Enciclopédia Britânica (1911) opina que ele "está indiscutivelmente no posto mais alto entre os homens letrados de todas as eras". Sua obra foi lida por suas lições de moral, por sua narrativa dramática e por seu estilo de prosa [77]. Fora do campo da história, a influência de Tácito é mais proeminente na área da teoria política [77]. Segundo Giuseppe Toffanin, suas lições políticas caem, a grosso modo, em dois campos: os "tacitistas vermelhos", que usam Tácito para defender os ideais republicanos, e os "tacitistas pretos", que o leem como uma lição de realpolitik maquiavélica [78].

Embora sua obra seja a nossa fonte mais confiável para a história deste período, sua acurácia factual já foi ocasionalmente questionada. Os "Anais" são baseados parcialmente em fontes secundárias e há alguns erros óbvios, como, por exemplo, a confusão entre as duas filhas de Marco Antônio e Otávia Menor, que foram chamadas de Antônia. Este tipo de lapso ocasional era comum também na obra de Suetônio. "Histórias", por outro lado, foi escrito com base em fontes primárias e a partir de um conhecido testemunhal do período flaviano e é, portanto, uma obra muito mais acurada.

Ver também

Notas

1.  Como ele foi nomeado questor durante o curto reinado de Tito e vinte e cinco anos era a idade mínima para a posição, a data de seu nascimento pode ser fixada com alguma exatidão.
2.  Revilo P. Oliver examina as evidências para cada prenome sugeridos — os mais conhecidos "Caio" e "Públio" e também as sugestões menos conhecidas, "Sexto" (Sextus)[4] e "Quinto" (Quintus) — antes de decidir por "Públio" como o mais provável[5][6].
3.  Em "Anais"[36], Tácito menciona que, como pretor, ajudou a organizar os Jogos Seculares de Domiciano, uma tarefa dos quindecênviros, e cuja data pode ser fixada com certeza em 88[37][38][17].
4.  Em "Agrícola"[39], o próprio Tácito indique que ele e sua esposa estavam ausentes de Roma na época da morte de Agrícola (93).
5.  Em "Agrícola"[49], ele anuncia o que provavelmente seria o seu 1.º grande projeto, as "Histórias"[50].
6.  Em "Anais"[52], Tácito afirma que o Império Romano "agora se estende até o mar Vermelho". Se por mare rebrum ele se refere ao Golfo Pérsico, a passagem deve ter sido escrita depois das conquistas orientais de Trajano em 116, mas antes de Adriano abandonar os novos territórios no ano seguinte. Mas esta passagem pode apenas indicar a data da publicação dos 1.ºs livros de "Anais" e, por isso, é possível que ele tenha vivido até o reinado de Adriano. Não há motivos para acreditar que não[53][54][55][56], apesar da discordância de alguns autores[57].
7.  Opiniões acadêmicas sobre a "História Augusta" variam de "um confuso e inútil rumor"[60] até "ficção pura"[61].
8.  Jerônimo[63] afirma que a obra de Tácito, ainda existente, consistia de triginta volumnibus ("trinta volumes")[64].

Referências


1.        Van Voorst (2000), p. 39-42
2.        Ferguson (2003), p. 116
3.        OGIS 487, Bulletin de correspondance hellénique, 1890, pp. 621–623
4.        Mattingly (1972), p. 169–185
5.        Oliver (1977)
6.        Oliver (1951)
7.        Tácito, Histórias I.1
8.        Tácito, Anais XIII.27
9.        Syme (1958), pp. 612–613
10.     Gordon (1936), pp. 145–146
12.     Syme (1958), p. 60, 613
13.     Gordon (1936), p. 149
14.     Martin (1981), p. 26
15.     Syme, 1958, p. 63
16.     Grant (2006), p. 17
17.     Benario (1999), p. 1.
18.     Syme, 1958, pp. 614–616
19.     Syme (1958), pp. 616–619
20.     Plínio, o Jovem, Epístolas 23
21.     Syme (1958), p. 619
22.     Gordon (1936), p. 145
23.     Como em Tácito, Anais II.9
24.     Gordon (1936), pp. 150–151
25.     Syme, 1958, pp. 621–624
26.     Tácito, Diálogos II
27.     Martin (1981), p. 26
28.     Syme, 1958, pp. 114–115
29.     Tácito, Agrícola, IX
31.     Benario (1975), pp. 15, 17
32.     Syme (1958), pp. 541–542
33.     Syme (1958), p. 63
34.     Martin, 1981, pp. 26–27
35.     Tácito, Histórias I.1
36.     Tácito, Anais XI.11
37.     Syme (1958), p. 65
38.     Martin, 1981, p. 27
39.     Tácito, Agrícola XLV.5
40.     Syme (1958), p. 68
41.     Benario (1975), p. 13
42.     Dudley (1968), pp. 15–16
43.     Martin (1981), p. 28
44.     Mellor (1993), p. 8
45.     Dudley (1968), p. 14
46.     Mellor (1993), pp. 8–9
47.     Tácito, Agrícola XLIVLXV
48.         Plínio, o Jovem, Epístolas II.1 (em inglês)
49.     Tácito, Agrícola III
50.     Dudley (1968), p. 16
52.     Tácito, Anais II.61
53.     Dudley (1968), p. 17
54.     Mellor (1993), p. 9
55.     Mendell (1957), p. 7
56.     Syme (1958), p. 473
57.     Como Goodyear (1981), pp. 387-393.
58.     Benario (1999), p. 2
60.     Mendell (1957), p. 4
61.     Syme (1958), p. 796
62.     Sidônio Apolinário, Epístolas IV.14
63.     Jerônimo, Comentário sobre Zacarias XIV.1,2
64.     Mendell (1957), p. 228
65.     Tácito, Anais IV, 34-35
66.     Tácito, Anais I, 63
67.     Tácito, Anais I,1
68.     Tácito, Histórias I.4
69.     Dudley (1966), p. 14
70.     Ostler (2007), pp. 98–9 de onde vem o exemplo citado
71.     Taylor (1998), p. 1ss
72.     Tácito, Anais I.72
73.     Tácito, Anais 4.64-66
74.     Plínio, o Jovem, Epístolas VII §33
75.     Grant (1978), p. 378ss
76.     Mellor (2010), p. 3
77.     Mellor (1995), p. 17
78.     Burke (1969), pp. 162–163

Bibliografia

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Ligações externas

 


Anais


Anais (lat.: Annales) é o título de uma obra histórica escrita por Tácito que relata a vida de 4 imperadores, os que sucederam a César Augusto. As partes da obra que chegaram até a atualidade tratam de grande parte dos governos de Tibério e de Nero.

Provavelmente o título Annales não fosse o original dado por Tácito à obra, mas derive do fato de ele escrever a obra tratando a história de ano em ano. O título original talvez fosse Ab excessu divi Augusti ("Desde a morte do divino Augusto").

 

Conteúdo

Os Anais foram a obra final de Tácito. Escreveu ao menos 16 livros, mas os livros 7-10 perderam-se, bem como parte dos livros 5, 6, 11 e 16. O livro 6 acaba com a morte de Tibério e os livros do 7 ao 12 cobriam presumivelmente os governos de Calígula e de Cláudio. Os demais livros tratam do governo de Nero, provavelmente até a sua morte em junho de 68, ou até final desse ano, para depois se juntar às Historiae. A segunda parte do livro 16 perdeu-se (termina narrando os eventos de 66) [1]. Não se sabe se Tácito completou a obra ou decidiu terminá-la antes de outros trabalhos que planejasse escrever; faleceu antes de poder trabalhar nas histórias de Nerva e Trajano e do período de Augusto e os começos do império, que havia prometido escrever.

Assim como já tinha escrito nas Historiae, Tácito sustém a sua tese em relação à necessidade do principado. Se por um lado elogia Augusto por ter garantido a paz no estado romano após anos de guerra civil, por outro amostra as desvantagens da vida sob o domínio dos Césares. Da história do Império Romano forma parte o ocaso definitivo da liberdade política da aristocracia senatorial, que Tácito via moralmente decaída, corrupta e servil com os desejos do soberano. Ainda nesta obra, como já sustivera em Cneu Agrícola, Tácito opõe-se a que elijam um inútil martírio através do suicídio[2]. Ao descrever o suicídio de Petrônio, Tácito sublinha deliberadamente o irônico câmbio dos modelos filosóficos realizado por este homem.

Contudo, contra este tétrico contexto, uma parte da classe política continuou exercitando honestamente o seu próprio poder sobre as províncias e guiando o exército com rectidão. A historiografia trágica, cheia de eventos dramáticos, tem um peso importante nos Annales. Tácito usa os componentes trágicos da história para penetrar nos ânimos das personagens e iluminar as suas paixões e ambiguidades. As paixões dominantes nas personagens são as políticas (exceto, talvez, no caso de Nero). Todas as classes sociais, sem exceções, têm estes defeitos: ambição, desejo de poder e de prestígio pessoal, e muitas vezes inveja, hipocrisia e presunção. Todos os demais sentimentos, exceto a ambição, vanidade e avarícia, têm uma importância secundária[3].

Nos Anais, Tácito desenvolveu ulteriormente o estilo de descrição que tinha usado nas Historiae. Talvez o retrato melhor que faz seja o de Tibério, feito de maneira indireta, emergem progressivamente no curso da narração, com observações e comentários. O retrato moral tem a precedência sobre o físico; há também retratos paradoxais.[4] O mais significativo destes é o de Petrônio, cuja fascinação está nas suas contradições. A debilidade da sua vida está em oposição com a energia e a competência que demonstrou nos deveres públicos. Petrônio afrontou a morte como um último prazer, dando contemporaneamente prova de autocontrole, coragem e firmeza. Opôs-se ao uso estoico do suicídio teatral, tanto que falava com os amigos enquanto morria, de argumentos fúteis. Tácito não faz dele um modelo a seguir e assim sugestiona implicitamente que a sua grandeza de ânimo foi mais sólida que a mostrada por tantos "mártires" estoicos[5].

 

Estilo

Embora seja uma simplificação, é correto reconhecer que o estilo de Tácito nos Annales parte das normas gramaticais e de composição dos autores da República Tardia, 1.º entre todos Cícero. Descrito como peregrino, arcaico e solene, Tácito atinge o seu estilo pessoal através de raras embora não únicas formas gramaticais, elipses frequentes (especialmente das formas auxiliares do verbo esse), circunlocuções criativas e dições que se estendem até os limites do léxico latino. Em comparação com as Historiae, os Annales são menos fluidos, muito mais concisos e severos. Há até mesmo uma predileção maior pelas incongruências. As formas verbais pouco harmônicas refletem os eventos discordantes que narram e a ambiguidade das personagens que descrevem. Há muitas metáforas "violentas" e usos audazes da personificação. O estilo poético, especialmente o de Virgílio, é usado com frequência. Por exemplo, a descrição da expedição de Germânico ao lugar da Batalha da floresta de Teotoburgo na procura dos restos das legiões destruídas de Públio Quintílio Varo recalca o estilo usado por Virgílio na descrição do descenso de Eneias ao mundo ultraterreno.

Contudo, o estilo muda. Do livro 13 em diante, Tácito usa um estilo mais tradicional, mais próximo dos cânones do estilo clássico. Sua prosa torna-se mais rica e elevada, menos concisa, menos áspera e insinuante. Ao escolher entre sinônimos, Tácito prefere o uso de expressões normais e pouco afetadas. Provavelmente o governo de Nero seja tratado com menos solenidade porque cronologicamente é mais próximo do tempo da redação da obra, enquanto a idade de Tibério seja considerada como mais próxima à velha República. A falta de pormenores que às vezes emergem nos livros 15 e 16 induziu alguns a suster que as versões que chegaram à atualidade não fossem a versão definitiva, mas um rascunho pendente de revisão.

Referências

1.        JOLY, Fabio Duarte. 2004. Tácito e a metáfora da escravidão. Sâo Paulo: Edusp, p. 44.
2.        Tac. Agr., 42.
3.        Santoro L'oir, F. 2006. Tragedy, Rhetoric, and the Historiography of Tacitus' Annals. Ann Arbor, Mich.
4.        CAMPOS, Rafael da Costa. 2010.A caracterização de Tibério César Augusto como personagem política nos Anais de Tácito. Mare Nostrum, v. 01, p. 11-25.
5.        Tac. Ann., XVI, 18-19.
6.        Este artigo foi inicialmente traduzido do artigo da Wikipédia em espanhol, cujo título é «Anales (Tácito)»., e por sua vez,
7.        Este artigo foi inicialmente traduzido do artigo da Wikipédia em italiano, cujo título é «Annales (Tacito)».

 

Bibliografia

·         ARICI, AZELIA, (ed). Annali di Tacito, UTET, Turim 1983, ISBN 88-02-02665-3
·         MARQUES, J. B. 2012. Públio (Gaio) Cornélio Tácito. In: Parada, Maurício (Org.). Os Historiadores: Clássicos da História. Rio de Janeiro: PUC-Rio/Vozes, v. 1, p. 88-106. ISBN 978-85-326-4284-4
·         MELLOR, R. 2011. Tacitus' Annals. Oxford: Oxford University Press. ISBN 978-0-19-515193-0
·         WALKER, B. 1952. The Annals of Tacitus: A Study in the Writing of History. Manchester. ISBN 978-0-71-900061-4

 

Ligações externas

·         CORNÉLIO TÁCITO, Anales, ed. Ch.D. Fisher, Oxford, Clarendon Press, 1906.
·         Annales The Latin Library (comprovado 17-05-2009). (em latim)
·         Annales .- Perseus Project (comprovado 17-05-2009). (em inglês) (em latim)

Histórias


Histórias (em latim: Historiae) é um livro do historiador romano Tácito por volta de 100 - 110, que cobre o ano dos 4 imperadores após a queda de Nero, a subida de Vespasiano, e o governo da Dinastia Flaviana (6996) até a morte de Domiciano.

Recepção

O amigo do autor, Plínio, o Jovem, falou em uma carta a Tácito "Suas Histórias serão imortais"[1] e o autor cristão primitivo Tertuliano criticou o livro por afirmar que contém mentiras sobre as crenças judaicas.[2]

 

Ligações externas


Tácito e os Cristãos


No texto Anais, do historiador romano Tácito (56 d.C. – 117 d.C.) no livro XV, parágrafo 44, escrito em 116 d.C., existe uma passagem referente a Cristo, Pôncio Pilatos e à execução em massa de cristãos [1]. A passagem descreve o incêndio de Roma que durou seis dias, queimando grande parte da cidade em Julho de 64 d.C. Muitos romanos culparam o Imperador Nero pelo incêndio.

Tradução em português

Para se livrar dos rumores, Nero criou bodes expiatórios e realizou as mais refinadas torturas em uma classe odiada por suas abominações: os cristãos (como eles eram popularmente chamados). Cristo, de onde o nome teve origem, sofreu a penalidade máxima durante o reinado de Tiberius, pelas mãos de um dos nossos procuradores, Poncio Pilatos. Pouco após, uma perversa superstição voltou à tona e não somente na Judéia, onde teve origem, como até em Roma, onde as coisas horrendas e vergonhosas de todas as partes do mundo encontram seu centro e se tornam populares. Em seguida, foram presos aqueles que se declararam culpados, então, com as informações deles extraídas, uma imensa multidão foi condenada, não somente pelo incêndio, mas pelo seu ódio contra a humanidade. Ridicularizações de todos os tipos foram adicionadas às suas mortes. Os cristãos eram cobertos com peles de animais, rasgados por cães e deixados a apodrecer; crucificados; condenados às chamas e queimados para que servissem de iluminação noturna quando a luz do dia já tivesse se extinguido.[2]

Christianos ou Chrestianos?

Detalhe do Manuscrito Mediciano, mostrando a palavra “christianos”. A lacuna entre o “i” e o “s” aparece destacada; um “e” é visível sob luz ultravioleta, mostrando que essa seria a letra original.

Na antiguidade, tanto no mundo grego quanto no latino, os cristãos (“christiani”) eram muitas vezes chamados de “Chrestiani”, isso porque confundiam a palavra “Christus” com “Chrestus” ".[3], que era mais comum. As cópias remanescentes dos trabalhos de Tácito derivam de dois principais manuscritos, conhecidos como os “Manuscritos Medicianos”, escritos em latim. Esses se encontram na Biblioteca Medicea Laurenziana, em Florença. O segundo Manuscrito Mediciano é a cópia sobrevivente mais antiga que se refere aos cristãos e é datada do séc. XI, vinda do Monte Cassino[4]. Nesse manuscrito, o 1.º “i” da palavra “Christianos” é consideravelmente distinto do segundo, parecendo um tanto borrado, além de não ter a perna presente no segundo “i”; além disso, há uma lacuna entre o 1.º “i” e o “s” que vem logo em seguida. Georg Andresen foi um dos 1.ºs a comentar sobre a aparência do 1.º “i” e a lacuna, sugerindo em 1902 que o texto foi alterado e que havia, originalmente, um “e” no lugar do “i”.[5]
Em 1950, a pedido de Haral Fuchs, a Drª Teresa Lodi, diretora da Biblioteca Medicea Laurenziana, examinou as características desse item do manuscrito; ela concluiu que existem sinais de um “e” apagado por remoção da parte superior e inferior horizontal e a distorção do remanescente em um “i”. [6] Em 2008, a Drª Ida Giovanna Rao, nova diretora do escritório de manuscritos da Biblioteca Medicea Laurenziana, realizou novamente o estudo da Drª Lodi e concluiu que é provável que o “i” seja uma correção de um caractere anterior (como um “e”); a mudança, contudo, foi extremamente sutil. Posteriormente , no mesmo ano, foi descoberto que, sob luz ultravioleta, um “e” fica claramente visível na lacuna. Conclui-se, portanto, que a passagem devia originalmente se referir a chrestianos, uma palavra grega latinizada que pode ser interpretada como “o bom”, a partir da palavra grega χρηστός (chrestos) - termo que, por sinal, significa “bom, útil”. [7] De acordo com o Professor Robert Renehan, "era natural para um romano confundir as palavras [Christus e Christianus] com a de som similar χρηστός (Chrestos) "[8]. Alguns escribas gregos aparentemente tinham o mesmo problema, já que, de acordo com o Códex Sinaiticus e o Minúsculo 81, a palavra “cristãos” aparece como Χρηστιανούς nos Atos dos Apóstolos 11:26. [9]

 

Autenticidade e confiabilidade

São poucos os estudiosos que contestam a autenticidade da passagem.[10] Somente P. Hochart, em 1885, propôs que era uma fraude pia.[11] Contudo, o editor da Oxford de 1907, Furneaux, dispensou sua sugestão e trata a passagem como genuína. [12]
Robert van Voorst escreveu que a passagem não poderia ter sido forjada, pois os cristãos não promoveriam sua fé como sendo uma “perversa superstição”, “fonte do mal” ou ainda como sendo “horrenda e vergonhosa”, embora “lá tenha crescido um sentimento de compaixão” em relação aos cristãos.[13] John P. Meyer afirma não existir nenhuma evidência arqueológica ou histórica que dê suporte ao argumento de que algum escriba cristão tenha introduzido a passagem no texto. [14]

 

O cargo de Pilatos

O cargo de Pilatos enquanto esse foi governador da província romana da Judéia aparece em uma inscrição em latim, a qual se refere a ele como prefeito. [15] A passagem de Tácito, porém, se refere a ele como procurador. Flávio Josefo utiliza o termo genérico grego ηγεμων, ou governador, para falar de Pilatos. Van Voorst acredita que o uso de tão diferentes termos é o que se espera de testemunhos escritos em diferentes línguas, em diferentes períodos da História. [16] Tácito registra que foi o Imperador Cláudio quem deu aos procuradores poder de governo. [17][18] Após a morte de Herodes Agrippa em 44 d.C., quando a Judéia voltou para o controle direto de Roma, Cláudio deu aos procuradores o controle da região.[19][20]

 

Ver também

 

Referências


1.        Robert E. Van Voorst, Jesus Outside the New Testament: An Introduction to the Ancient Evidence, Wm. B. Eerdmans, 2000, p.39
2.        Tácito, Anais 15.44,traduzido para o português através da tradução em inglês de Church e Brodribb.
3.        Harald Fuchs, Tacitus über die Christen, Vigiliae Christianae, Vol. 4, No. 2 (Apr., 1950), pp. 65-93. Nas págs. 70-71 : "Die Bezeichnung der Christen als Chrestiani ist, wie mancherlei Belege erweisen, im Osten und Westen verbreitet gewesen. Der Christenname, der in seiner richtigen Form den Fernerstehenden nicht ohne weiteres verständlich war, erinnerte in dieser Fassung an das griechische Wort χρηστός und bot damit einem jeden die Möglichkeit, ihn entweder durch das Adjektiv oder auch durch den gleichlautenden Eigennamen zwanglos zu erklären." – “A designação de cristãos como “chrestiani” era, como muitos documentos provam, espalhada tanto no Ocidente quanto no Oriente. O nome “christiani”, que é a forma correta, não era facilmente entendida por muitos, e acabou sendo relacionada à palavra grega χρηστός, dando, assim, possibilidade de ser entendida em referencia tanto ao adjetivo quanto ao nome em si.”
4.        Newton, Francis,The Scriptorium and Library at Monte Cassino, 1058–1105, Cambridge University Press, 1999. "The Date of the Medicean Tacitus (Flor. Laur. 68.2)", p. 96-97.
5.        Georg Andresen em Wochenschrift fur klassische Philologie 19, 1902, p. 780f
6.        Harald Fuchs, Tacitus on the Christians, publicado em Christian Vigil (1950) volume 4, numero 2, p. 70, nota 6
8.        Robert Renehan, "Christus or Chrestus in Tacitus?", La Parola del Passato 122 (1968), pp. 368-370
9.        Nestle-Aland, Novum Testamentum Graece, Deutsche Bibelgesellschaft, Stuttgart, 26. neu bearbeitete Auflage, 1979
10.     Robert Van Voorst, Jesus Outside the New Testament: An Introduction to the Ancient Evidence, Wm. B. Eerdmans, 2000. p. 39-53
11.     Henry Furneaux, ed., Cornelii Taciti Annalium ab excessu divi augusti libri. The annals of Tacitus with introduction and notes, 2nd ed., vol. ii, books xi-xvi. Clarendon, 1907. Appendix II, p. 416f.: "A passagem foi acusada por um escritor recente, com fracos argumentos, de ter sido uma falsificação cristã. Isso se torna, como a oposição vê, um ataque às outras passagens de autores clássicos desse período" O editor dá como referência "P. Hochart, Etudes au sujet de la persecution des Chretiens sous Nero, Paris, 1885." e nota que "Hochart trata as duas cartas de Plínio e Trajano como uma fraude pia similar."
12.     Henry Furneaux, ed., Cornelii Taciti Annalium ab excessu divi augusti libri. The annals of Tacitus with introduction and notes, 2nd ed., vol. ii, books xi-xvi. Clarendon, 1907. Appendix II, p.418: "Parece estranho que, qualquer um que tenha estudado a passagem interpolada em Josefo, ou o correspondente de São Paulo e Sêneca, suponha que isso é apenas uma similar, porém, mais habilidosa performance do mesmo tipo, que se apresenta aqui perante a nós. Assumindo que a passagem seja genuína, podemos acrescentar que os textos Medicianos parecem estar danificados somente em um ou dois trechos."
13.     Robert E. Van Voorst, Jesus Outside the New Testament: An Introduction to the Ancient Evidence, Wm. B. Eerdmans, 2000. p 39- 53
14.     Meier, John P., A Marginal Jew: Rethinking the Historical Jesus, Doubleday: 1991. vol 1: p. 168-171.
15.     Vide discussão em livius.org
16.     Robert E. Van Voorst, Jesus Outside the New Testament: An Introduction to the Ancient Evidence, Wm. B. Eerdmans, 2000. p 39-53
17.     Tácito, Anais 12.60: Cláudio disse que os julgamentos de seus procuradores tinham a mesma eficácia de seus próprios.
18.     P. A. Brunt, Roman imperial themes, Oxford University Press, 1990, ISBN 0198144768, 9780198144762. p.167.
19.     Tácito, Histórias, 5.9.8.
20.     Geoffrey W. Bromiley, The International Standard Bible Encyclopedia, Wm. B. Eerdmans Publishing, 1988. ISBN 0802837859, 9780802837851. p.979, col.1.

 

Ligações externas


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